Ana Priscila, acusada de ser uma das lideranças do 8 de janeiro, disse que “bastaria um soldado raso nos avisar que deveríamos sair, que teríamos ido embora” dos acampamentos
Em depoimento prestado à CPI dos atos antidemocráticos nesta quinta-feira (28), Ana Priscila Silva de Azevedo contou que os manifestantes bolsonaristas acampados em frente ao Quartel General do exército em Brasília foram instruídos por membros da própria corporação para que saíssem do local a fim de não serem presos.
A decisão de retirada dos manifestantes acampados foi do ministro Alexandre de Moraes (STF), expedida um dia depois dos ataques. Respondendo ao presidente da CPI, deputado Chico Vigilante (PT), Ana confirmou que o comando do Exército teria, inclusive, impedido a entrada da PM nos acampamentos para que familiares dos membros das forças armadas pudessem fugir em segurança. “Os tanques fizeram uma barreira para que a viaturas não pudessem entrar”, afirmou a depoente.
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Em outro momento, Ana chegou a sugerir que as forças armadas prestavam apoio declarado ao movimento extremista. “Jamais pensei que, ao atender ao chamado de militares, poderia ser marcada e presa, pois, até então, era a instituição com os maiores índices de aprovação pelos patriotas. Afinal, os acampamentos ficaram montados por tanto tempo sem ninguém falar nada em sentido contrário”, declarou.
Ela completou dizendo que “bastaria um soldado raso nos avisar que deveríamos sair, que teríamos ido embora. Ao contrário, vários foram os chamados para que fosse mantida a mobilização popular”.
Ana cita VAR para explicar a desconfiança nas urnas
A depoente contou que a principal pauta dos manifestantes era a desconfiança com relação às urnas eletrônicas. Segundo ela, a nota emitida pelo Ministério da Defesa sobre a inviolabilidade do sistema eleitoral deu a entender que as urnas poderiam ser invadidas, o que teria sido a principal motivação para os acampamentos e o ataque às sedes dos poderes.
Afirmando que queria votos auditáveis, ela chegou a fazer uma analogia entre as urnas eletrônicas e o VAR (Video Assistant Referee), sigla em inglês para “árbitro assistente de vídeo”, tecnologia utilizada no futebol para auxiliar na checagem e validação de lances. “A gente só queria a certeza da transparência. É como se fosse o VAR, o gol valeu ou não valeu? Pronto, era só isso que queríamos saber”, afirmou.
“Nós vamos colapsar o sistema”: CPI exibe vídeos da depoente durante manifestações.
Apesar de mencionar diversas vezes que sua atuação nos atos de 8/1 teria sido pacífica, distritais mostraram durante a oitiva vídeos em que ela comemorava com outros manifestantes a invasão e destruição do patrimônio público.
Em uma das imagens, Ana é vista comemorando a queda de uma viatura no espelho d’água que fica em frente ao Palácio do Planalto. Em outra gravação, ela conclama outros manifestantes a se juntarem ao grupo que estava vindo a Brasília. “Nós vamos colapsar o sistema. Nós vamos sitiar Brasília, nós estamos tomando o poder de assalto”, diz em um dos vídeos.
Contudo, durante toda a oitiva, ela negou que o intuito dos invasores era promover um golpe de Estado e afirmou que não cometeu crimes pois estava respaldada pelos direitos constitucionais de ir e vir e de liberdade de pensamento. “Não sou golpista, sou patriota”, declarou.
Ela afirmou ainda que o objetivo da invasão era causar repercussão internacional para o resultado das eleições. Segundo ela, além de desconfiar da inviolabilidade das urnas, os manifestantes estranhavam o fato de o ex-presidente Bolsonaro ter perdido as eleições sendo que aparentava ter maior apoio popular. “Bolsonaro arregimentava milhões de pessoas nas ruas e o candidato da esquerda conseguia reunir só uns gatos pingados, o resultado das ruas não batia com o resultado das eleições. Não é só a questão do código-fonte”, afirmou.
A fala foi rebatida pelo deputado Max Maciel (PSOL), que afirmou que tanto esquerda como direita angariavam considerável apoio popular. “Alguns vivem numa bolha”, disse o deputado referindo-se à depoente.
8 meses na solitária
À comissão, Ana denunciou abusos que estariam ocorrendo na Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF), o presídio Colmeia. Ela contou que ficou 8 meses presa em cela solitária, sem ter acesso a banho de sol por todo esse período e que não foi apresentada nenhuma justificativa jurídica que motivasse o ato.
A deputada Paula Belmonte (Cidadania) cobrou da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar (CDDHCEDP), presidida pelo deputado Fábio Félix (PSOL), que averigue a denúncia.
Ainda durante o depoimento, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária informou à CPI que a medida de colocá-la em cela isolada teria sido adotada para resguardar sua segurança, pois, segundo secretaria, no mesmo presídio havia outras presas envolvidas nos atos de 8/1 que acreditam que Ana seja uma “infiltrada da esquerda”. Chico Vigilante informou que vai cobrar uma resposta oficial documentada da secretaria.
“Missão dada é missão cumprida”
Uma das linhas da raciocínio apresentada é a de que a depoente teria promovido as invasões a serviço de alguém, e que ela poderia ser uma infiltrada. O que motivou a tese é um trecho de um vídeo em que Ana aparece dentro do Palácio do Planalto já depredado afirmando que “missão dada é missão cumprida”.
Em resposta ao deputado Pastor Daniel de Castro (PP), ela justificou que o termo seria apenas um “jargão militar” e refutou a tese de que teria agido ou induzido outros manifestantes a agirem sob comando de alguém. “Eu não recebi missão nenhuma”, afirmou.
Em outro vídeo, datado de 2019, Ana aparece fazendo críticas ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o que atualmente estaria sendo utilizado para insinuar que ela seria uma infiltrada nos movimentos de direita. Porém, a depoente contou que as críticas foram feitas porque, à época, o ex-presidente Bolsonaro teria dito que não era anticomunista e que o ex-presidente da Venezuela, Hugo Chávez, seria uma esperança à América Latina.
Ana afirmou que, por conta dessas falas, chegou a cogitar que Bolsonaro seria um “infiltrado da esquerda”, mas que depois mudou de opinião e passou a reconhecê-lo como patriota e de direita. “Na época, eu pensei que Bolsonaro fosse um infiltrado, que estaria usando as forças armada, por conta dessas falas sobre o Hugo Chávez”.